sábado, setembro 16, 2017

Diversos

Os países da América Latina têm um passado não escrito, um passado cujos principais protagonistas foram os povos originários que habitavam o continente desde tempos imemoriais e que deixaram para as futuras gerações um enorme legado cultural que ao longo do tempo e apesar das adversidades ainda hoje perdura. O idioma e as costumes ancestrais, os mitos e as histórias que foram contadas pelos avós dos avós continuam vivos em nós e continuarão vivos nos nossos filhos.


Há cinco meses atrás eu não tinha uma perspectiva muito clara de como é que as culturas estrangeiras veem os povos indígenas e os países considerados “em desenvolvimento”. A minha percepção estava focada apenas num ângulo e a minha curiosidade por compreender algo que não conhecia foi o que me empurrou a fazer esta viagem. Um projecto do Serviço Voluntário Europeu em Portugal foi a chave para lográ-lo e este é sem dúvida um país multicultural que abre as suas portas a milheiros de pessoas de todo o mundo: viageiros de passo, turistas, migrantes e pessoas que por diferentes motivos chegam a este formoso lugar da Europa. As oportunidades para criar conexões inimagináveis entre pessoas tão diversas e com histórias tão diferentes são tão grandes que conseguir perceber completamente cada história, cada pessoa, seria impossível. Existem cá habitantes de países remotos e culturas desconhecidas das que pouco ou nada se sabe nos países mais “desenvolvidos”. Existe também, portanto, uma falta de informação sobre esses assuntos que se traduz na adopção de estereótipos para referir-se a pessoas que chegam de países de África, Ásia e América Latina. E este fenómeno não acontece apenas em Portugal mas em todos os países do mundo em diferentes contextos e é sempre o forâneo, o desconhecido, aquel que tem outros hábitos ou formas de vida o que irá ter uma etiqueta colada no rosto. Pergunto-me, então, porquê não fazemos nada para acabar com este problema se a solução poderia ser muito simples.

Após uma longa luta de mais de 500 anos contra a aculturação, a injustiça e a discriminação, os movimentos indígenas fortalecem cada dia mais as suas raízes para poder afrontar estes conflitos e para ter um lugar importante nos processos sociais e culturais de cada país, evitando a exclusão e fomentando a interacção com outros sectores sociais, para conseguir assim uma visão mais ampla no contexto do mundo globalizado em que vivemos sem perder a essência que nos caracteriza e o valor do auto-reconhecimento.


O poder da comunicação, o acesso à informação e a empatia são a chave para deixar atrás os prejuízos culturais que só criam muros de ignorância entre as pessoas e nos impiden compreender que os estereótipos que nos etiquetam são apenas invenções duma cultura dominante obsoleta. Deveríamos melhorar a nossa interação numa comunidade mais diversa porque é através das pessoas que podemos conhecer distintas realidades sem necessidade de viajar e também aceitar que todos nalgum momento sentir-nos-emos desconhecidos ou foráneos quando estamos longe de casa.

sexta-feira, setembro 15, 2017

Era uma vez...

Toda boa história começa com um “Era uma vez...” e esta é uma dessas boas histórias que fala duma rapariga que decidiu ir explorar o mundo sozinha. Uma rapariga que ainda com medo do desconhecido pegou na sua mala e que com poucas roupas e muitas emoções foi viver para outro continente para descobrir e viver novas experiências.



Essa rapariga, sim, sou eu, a Pierina, e agora, alguns meses após essa decisão, tenho a sorte de ter vivido momentos incríveis. Agora sinto que vivi em Portugal o tempo suficiente como para dizer que voltando para o Perú estarei a deixar cá a minha casa e a minha segunda família. Desde o mesmo momento em que entrei no avião para Portugal o SVE já estava a fazer mudanças em mim e durante estes meses aprendi a ser mais paciente e a adaptar-me às diferentes situações e realidades em cada um dos país que percorri e, especialmente, aprendi a colocar a lógica à frente dos meus nervos para encontrar soluções e desenrascar-me. O facto de eu ter perdido um dos voos que me trouxe a Portugal fez com que tivesse melhorado (e muito) as minhas habilidades de comunicação em língua estrangeira e até na língua universal de gestos e sinais.

Com o passar do tempo acabei por sentir-me uma pessoa melhor, capaz de enfrentar melhor diferentes situações, aprendendo a aprender e a falar cada vez um pouco melhor o Português. Já consegui falar em nível básico mas de forma muito confiante e asertiva, cantar em nível intermédio e, acima de tudo, perceber tudo, tudo, tudo! Lentamente consegui que as minhas ideias e os meus pensamentos estivessem melhor comunicados em diferentes contextos, sem medo, sem limites e sem barreiras. Também até já consegui comunicar sem palavras com pessoas que não falavam Inglês e tem corrido muito bem!

Gostei (e ainda gosto) de tudo: do meu quarto, do meu bairro em São João do Estoril, dos meus novos amigos, do meu trabalho, do percurso de comboio com vista para o mar, do som do vento, das pequenas conversas com estranhos nas minhas viagens dentro e fora de Portugal, das pessoas amigáveis. Nunca antes teria pensado que puidesse gostar tanto de estar sozinha e aprendi também a desfrutar mais do meu próprio tempo.


Durante estes cinco meses de aventura tive a oportunidade de conhecer realidades diametralmente opostas à minha, países cujas realidades eu conhecia apenas através do telejornal. Aqui tenho ajudado e participado em actividades nas que conheci pessoas incríveis, que me serviram para saber apreciar o trabalho em equipa e para valorar o diálogo. Momentos óptimos para ganhar mais confiança e poder lidar melhor com a comunicação em Inglês, para ser mais criativa em actividades que conseguiram abrir-me a mente e o espírito.



Acontece que nem sempre nos encontramos com belos momentos. Pode ser que tenhamos medo e que não nos atrevamos a dar um primeiro passo, mas ainda com a incerteza de como é que um projecto de SVE vai correr eu faria-o sem pensar duas vezes para tirar proveito da grande oportunidade que ele significa. E porque, afinal, todos estamos feitos das histórias que vivimos.

"No final, não importa quantas respirações uma pessoa toma, mas quantos momentos tem de tirar o fôlego"